
Rodri, do Manchester City, comemora gol contra a Inter de Milão pela Liga dos Campeões / Imagem: Catherine Ivill/Getty Images
De uns anos para cá ficou difícil assistir a uma partida de futebol sem escutar a palavra protocolo.
Protocolo é a hiper-regulamentação do jogo que envolve uma série de regras disciplinares a respeito de hinos, entrada em campo, formação para foto, entrevistas nos intervalos, entrevistas pós-jogo, shows no pré-jogo, shows no intervalo; tudo pensado e executado para acomodar da melhor forma a mensagem dos patrocinadores.
Protocolos são criados para que mais apoiadores financeiros possam se sentir à vontade sabendo que sua marca estará devidamente instalada na imagem divulgada do espetáculo.
É natural que o interesse do dinheiro movimente uma partida, um campeonato. O que não me parece natural é que absolutamente tudo a ele precise se acomodar nem que isso signifique abrir mão da emoção, do sentimento, da vibração.
Protocolo é o oposto de liberdade.
Com o tempo, esquemas táticos estão se adaptando à rigidez dos cerimoniais.
Posições fixas em campo visam limitar a inventividade e oferecer a ilusão do controle.
O jogo passou a ser uma disputa territorial, como o futebol americano. Mas o futebol não é disputa por território, é — ao contrário — um jogo que fala a respeito de relações, de movimentos laterais, do diálogo que existe numa tabela, num passe, numa triangulação. Fala a respeito da forma como interagimos e não das zonas que conquistamos.
Em jogos tediosos, especialmente em finais cheias de expectativas, não é incomum que o narrador tente, com seus berros, forçar a emoção que falta. Vira um espetáculo nervoso de sons sem sentido cujo único imenso alívio passa a ser colocar no "mudo".
Nas cadeiras, o torcedor-cliente canta e vibra pouco exigente de um espetáculo que faça justiça ao exorbitante preço pago por ingressos, canais fechados, camisas etc.
O jogo, em sua fase ultraprotocolar, é controlado pelos petrodólares de ditaduras sanguinárias localizadas no Oriente Médio, mas quem se importa?
Acontece que o futebol, assim como a vida, é incontrolável. Ele existe justamente na nossa capacidade de nos adaptarmos a contingências.
O que é o drible se não exatamente criar espaço onde não havia nada antes dele?
Muito se debaterá a respeito das intenções táticas e estratégicas desse City x Inter pela final da Champions. Vou me privar de fazer essas análises e me limitar a um comentário simplório: foi um jogo ruim entre dois times que tentaram controlar tudo.
Não é absurdo dizer, embora possa soar ofensivo, que já vi jogos de várzea mais emocionantes.
Uma jogada de inventividade de Phil Foden, um drible sensacional que deixou o inglês na cara do gol, foi a princípio reprisada sem o drible, apenas com a imagem do chute final.
Que os patrocinadores fiquem felizes com essa hiperprotocolização do jogo me parece um contra-senso. O dinheiro deveria, justamente, querer se ligar à emoção, à vida, à pulsação, à beleza e à liberdade que só o esporte pode ritualizar.