
Jogadores da seleção brasileira comemoram gol de Richarlison contra a Bolívia pelas Eliminatórias Sul-Americanas / Imagem: Lucas Figueiredo/CBF
A seleção brasileira de futebol masculino começou nesse primeiro de abril sua caminhada para o sonho do inédito Hexa. Por todos os lados do noticiário que a gente olhe hoje a palavra Hexa, assim com H maiúsculo, explode em nossas vistas. Hexa pra cá, hexa pra lá, os caminhos possíveis, os adversários prováveis, os melhores e os piores cenários. Foi dado o pontapé inicial desse delírio coletivo.
Quando se trata de seleção brasileira não somos bons em buscar reflexões usando passagens dolorosas de nossa história. Na minha singelíssima opinião, por exemplo, o sete a um nunca foi de fato analisado. Não me refiro a análises táticas, estratégicas, de escalação, de pane emocional. Isso foi exaustivamente investigado. Falo de uma reflexão psicanalítica, de colocar a seleção - e a nossa paixão - no divã.
O sete a um não aconteceu enquanto a Alemanha metia seguidas bolas no gol de Julio Cesar. O sete a um começou décadas antes, quando abrimos mão de deixar que o jogo refletisse o que somos culturalmente e passasse a refletir o que somos institucionalmente.
Espelhar o que somos culturalmente nos levaria por um caminho de alguma musicalidade, de um jogo driblado, de um jogo coletivo, de um jogo ofensivo. A opção por espelhar o que somos institucionalmente nos levou por um caminho truculento de um jogo onde o drible acontece em ano bissexto, a ofensividade depende de como vamos nos defender antes de mais nada e os atacantes devem marcar acima de tudo; a falta de criatividade é quase um imperativo categórico.
Quando se trata do jogo, nos tornamos bastante parecidos com todas as demais seleções. E, se vamos usar as armas delas, a chance é a de que percamos mais cedo do que tarde.
Abrir mão de nossa essência é pagar caro demais por um caneco leve demais. A gente fala em hexa quando deveríamos estar falando em jogar bem, em jogar como a gente um dia soube jogar, em refletir no campo o que somos culturalmente. Mas não se fala disso. Queremos o hexa seja lá como for.
A seleção de Tite é uma ilusão. Um time que não encanta, que se consagrou sobre seleções que passam por momentos turbulentos - assim como todo o continente - e que viaja para a ditadura do Catar cheia de uma pompa que não merece mais.
Se me pedissem para apostar, apostaria contra. Mas não gosto dessa associação entre apostas e futebol, então não vou apostar nem um vintém. O Brasil pode, é óbvio, voltar com esse tão falado hexa. O jogo é imprevisível. Mas eu acho que só voltaremos a vencer com V maiúsculo quando conseguirmos respeitar o futebol em todas as suas potencialidades e formos capazes de nos deixar orientar taticamente pelo que somos culturalmente. Nesse dia, finalmente, teremos superado o sete a um e pararemos de fingir que ele nunca aconteceu.